Uma amiga do samba da Ouvidor cultiva uma tese interessante. Diz ela que há apenas três itens específicos que a gente encontra em qualquer casa brasileira. Abridor de garrafa do time de coração. Miniatura de galinha de angola. E um livro do Verissimo.
Faz sentido. Ou talvez eu aprecie a teoria por ter certa intimidade com os três – a penosa, tadinha, fica uma delícia no festejado restaurante da dona Licéia.
Por sorte, fiz uma série de pesquisas para livros do Luís Fernando, que aniversaria neste dia 26 de setembro. Numa dessas caçadas a textos perdidos, me deparei com uma joia rara. A verdadeira história da criação da cerveja. Crônica quase inédita de Luis Fernando Verissimo, escrita há algumas décadas a pedido de um amigo cervejeiro:
“A cerveja foi inventada por Otto, da tribo dos Biermans, uma das tantas tribos pré-germânicas que perambulavam pelo norte da Europa, que naquele tempo nem sabia
que se chamava Europa.
Os Biermans eram nômades e viviam da caça, da pesca e do apfelstrudel, e Otto se notabilizou pela sua inconformidade com o leite de ursa e a água, as únicas bebidas disponíveis na época.
Tem que haver coisa melhor – dizia Otto. Ele experimentou muitas misturas, combinando a água com vários tipos de vegetação, frutas, animais e derivados e um dia achou que tinha acertado. Provou a mistura e imediatamente cuspiu fora. Não era o que ele queria. Tinha inventado a Pepsi Cola.
Otto não desistiu, no entanto, e continuou sua busca. Quando a tribo dos Biermans cansou de perambular, se estabeleceu num condomínio horizontal de cavernas e se dedicou à agricultura, o trabalho de Otto ficou mais fácil e em pouco tempo ele inventou a cerveja clara e a escura.
Enlouquecidos pela descoberta, os Biermans atacaram e conquistaram os Kpfumps, inventores da cadeira, e fundaram a primeira cervejaria. E é esta a história da cerveja. Numa versão livre, claro.”
Meu talento como pescador de pérolas como essas me levou a tomar algumas com o cronista mais querido do Brasil. Verissimo curte o famoso “chope submarino”, bem gelado e com schnapps no fundo, mas esse não bebemos.
Tomamos, sim, algumas boas canecas de chope gelado. Lembro até o dia, quem esqueceria? Era 10 de dezembro de 2016. Estávamos com Lúcia em mais um lançamento de livro, e o local era o shopping Pátio Batel, na fria Curitiba (não se pode ter tudo).
Após palestra e autógrafos, a noite caiu e fomos a uma hamburgueria, após breve escala numa loja de brinquedos. O primeiro canecão de chope desceu lindo.
Verissimo é bom de boteco, como praticante e como comentarista. Foi ele que notou, e deixou por escrito: “O bar perfeito deve ser o último refúgio do ócio inteligente.”
Entre o ócio e a inteligência, entrei numa de retribuir todas as boas risadas que Verissimo me ofereceu nesses anos todos. Mais duas canecas geladas, e eu lá na missão, tentando de tudo para fazer Luis Fernando Verissimo rir.
Mas o papo estava sério e interessante, e não me dei bem nas tentativas, até voltarmos ao hotel. De manhã, tomei café e chamei um táxi para nós três, até o aeroporto. Já víamos a placa do Embarque quando a rádio veio com o noticiário político de Brasília, e repeti uma piada qualquer que ouvira no Porta dos Fundos. Foi quando escutei um barulho estranho no banco de trás. Era Luis Fernando Verissimo. A gargalhar. A gargalhar!
Naquela semana, uma versão da piada, metade do Porta, um quarto minha e um quarto do Verissimo, estampou a crônica de todos os jornais do Brasil. Tim-tim!
E feliz oito oito, mestre!