Sempre que amigos do Pará, Portugal ou Piracicaba brotam no Rio de Janeiro, meu Whats pisca: alguma dica? Qual a boa da semana? Olá, que tal trocar seu filtro, Sr. Dupol? Bem, volta e meia rola um spam.
Costumo, para não errar, sugerir um esquema clássico, aquele 4-4-2 sem firula. De dia, praia em Ipanema e passeio pela Folha Seca na rua do Ouvidor; à noite, samba no BipBip ou rock no Empório. Domingueira? Maracanã, claro, com direito a pré no bar Madrid e pós no Parada de Copa, com chope escuro e sanduíche de pernil. Se faltar ingresso, jogo na TV das calçadas do Brewteco Leblon, para ver as modas do bairro. Durante a semana, camarão e cervejinha na mureta da Urca, com Circo Voador na Lapa para fechar. Nas palavras do grande Ariclenes Venâncio, tou certo ou tou errado?
Mas o roteiro começou a dar problema: ficou manjado. A sorte é que, esta semana, caiu-me às mãos “O Rio do Moa – Bandeira 2”, que acaba de ser lançado pela editora Mórula. É uma ótima seleta de crônicas de Moacyr Luz, um historiador de mão cheia, um mestre da geo gastronomia carioca e mestre no “folclore urbano” – além de músico nas horas vagas.
Moa, certamente um dos cinco maiores cariocas vivos – ali ali entre Zico e Zeca, ensanduichado entre Fernanda Montenegro e Paulinho da Viola – anota lugares do Rio onde ele foi feliz, o que comeu e, quando lembra, o que bebeu. E ainda brinda o leitor com dicas fundamentais para ser um bom boêmio. Por exemplo: o bom cervejeiro é aquele que bebe apenas seis meses por ano – isto é, um dia sim, um dia não.
Dono de um “apetite de baleia azul num oceano de manjubas” (copyright Moa), o criador do Samba do Trabalhador registra um arsenal de acepipes que fizeram a história do Rio. Agora não tem erro – na próxima vez que me pedirem dicas de excursões, vou enviar um roteiro para Moacyr Luz nenhum botar defeito. Com a recomendação de telefonar ou procurar no Google antes, para confirmar se as iguarias – e o próprio bar – ainda estão por lá (toc toc toc).
1) Ostras frescas na praia
Saboreadas na peixaria no Posto Seis, à sombra do forte de Copacabana.
2) Sardinha frita do bar Ocidental
Vulgo Beco das Sardinhas, o lugar é a cara do Rio e faz bem ao bolso. Dica: o bar Bigorrilho, no Leblon, e o Mercado de Niterói também servem o “frango marítimo” em grande
estilo.
3) Caldinho de jiló
A predileta do Moa é a do bar da Gema, na rua dona Zulmira, coração da Tijuca.
4) Fritada da casa Paladino
No bar centenário do centro da cidade, Moa aposta sempre na fritada mista, com queijo, presunto e cebola.
5) Ovas na Adega Pérola
Entre dezenas, centenas, de opções que iluminam a estufa envidraçada do bar de Copacabana, as ovas de peixe ao vinagrete são as prediletas do compositor.
6) Coração do Galeto Sat’s
Os mais pedidos na madrugada.
7) Punhetinha de bacalhau da Mercearia Dom Luiz
Segundo Moa, um dos melhores bacalhaus (“bacalhais”?) da cidade.
8) Arroz de cordeiro no Velho Adonis
Ao lado do Cadeg, um dos restaurantes mais antigos e conceituados da cidade. Vale ir até sem fome, já que o chope ali é sempre eleito um dos três melhores do Rio de Janeiro.
9) Maxixada
Criação da família de Mariana Padrão, do Bar da Frente, a iguaria consiste em maxixe recheado com calabresa em molho de tomate da casa, acompanhado de pão. Salivou?
10) Pastel de angu do Beco do Rato
Não visite o Rio sem prová-los – o acepipe e o samba do Beco.
11) Bolinho de arroz do Momo
Quitute banal na aparência, é a iguaria tijucana que faz Moacyr Luz salivar e estilhaçar sua dieta.
12) Costelão do Cachambeer
Regado. Vá sem tomar café da manhã. Melhor, nem jante na noite anterior.
13) Testículos de peru
Moa se gaba de ter saboreado de tudo nos botequins do Rio – de rãs à doré a testículos de peru. Este último, se acompanhado de cerveja caracu e ovos, faz zerar todos os trocadilhos.
14) Galopé
Iguaria máxima do cardápio de Moa, consiste num caldo feito a partir dos pés de galo. Duro de encontrar, mas vale pela descrição: “Uma loucura gastronômica com temperos de suicídio.”
Atenção: reserve ao menos dois ou três dias para o roteiro, se não quiser ir visitar o Redentor, Ele próprio, em pessoa. Em caso de dúvidas, pergunte ao próprio Moa, segundas-feiras no clube Renascença. É o dia em que sua turma, na voz marcante de Gabriel da Muda, leva o samba “Entre o torresmo e a moela”, clássico digestivo de Aldir Blanc e Maurício Tapajós. Burp!